BÓRGIA

Se nos anais da memória

Figuram heróis famosos,

Há registos na História

De patifes horrorosos.

(…)

 

in “Eu, Pierre Riviere, que degolei a minha mãe, a minha irmã e o meu irmão… Um caso de parricídio no século XIX” apresentação de Michel Foucault

 

 

Uma mulher como Lucrécia Bórgia chocou e provocou mentalidades, alimentando mitos e sonhos, desde que existiu até aos nossos dias. Continua a ser uma referência sempre que se quer evidenciar alguém ligado ao poder, a uma beleza pura e a uma alma desleal. É o poder o que se salienta em Bórgia. Dentro do poder existe a manipulação, submissão, ordem, comando …. E são factores/acções explorados no processo de trabalho, que teve em vista um trabalho coreográfico final onde a dança contemporânea fosse a expressão essencial, traduzindo todo o pensamento da coreógrafa à volta de mulheres controversas.

     A escolha de representação de uma só mulher em duas deve-se ao facto de se sentir que a vida de Lucrécia se poderia quase dividir em dois momentos, antes do homicídio depois, em que embora nunca haja uma inocência total (antes ou depois) há uma candura inicial que se perde ao longo da vida e dos crimes.

     Coreograficamente joga-se com elementos base de composição coreográfica assim como o conceito de poder sobre o outro, manipulação e condução do outro. A musica tem também uma existência crucial, uma vez que é tocada ao vivo e uma vez que o movimento é condicionado/manipulado por esta, vice-versa.

     Em cena encontram-se as duas intérpretes, que usando a mesma frase coreográfica como base, a expressam diferentemente devido à corporeidade distinta de ambas. Há momentos de repetição, pausa, bloqueio do outro, dependência do outro. Mantém-se a exploração e investigação do tema – poder.

     Brinca-se com a simplicidade de uma frase de movimento, assim como os Bórgia brincavam com a simplicidade da vida humana. Há uma constante manipulação no dia a dia, o exercício do poder nas vidas dos outros. Manipular os corpos, os movimentos ensaiados. Explorar o já explorado.

Direcção artística: Mariana Amorim

Criação e interpretação: Cláudia Eiras e Mariana Amorim

Sonoplastia: Gonçalo Rêgo

Desenho de Luzes: Ricardo Alves